psicanálise para quê?

Friday, October 10, 2008

DEPRESSÃO

Tomo aqui a liberdade de publicar parte de um email de meu amigo Reginaldo da Ong Afroreggae para comentá-lo:

"Minha cara amiga moro em um das maiores favelas deste pais e trabalho todos os dias em tantas outras e muitas vezes fico ruminando diante de fatos q estão diante de mim q de certa maneira todos acabam tendo um pouco de pânico e até depressão na verdade só não se fala mas abertamente sobre o assunto ou não se admite q se tem por exemplo em uma favela logo apos um intenso tiroteio é muito comum ver no semblante assim como nas atitudes das pessoas o pânico ainda presente e isso costuma se estender por dias até q se minorize até entra em uma falsa normalidade sim falsa por q na verdade o pânico esta lá pois todos sabem q momentos como aquele pode e vai se repetir é ai q neste processo de menorização surge a depressão as pessoas vão inconscientemente se isolando em busca de uma falsa defesa q acabam entrando na linha de risco maximo da depressão q é a solidão lugar difícil de voltar. E minha cara tudo isso pode e se repete em todas as demissões sociais é claro q cada um em sua estrutura."

Gostaría de dizer algo sobre isso: é claro que meu amigo fala de situações exóginas de pânico, fatos reais que acontecem na vida de várias pessoas que vivem em favelas, momentos de pânico que as pessoas que vivem nestas favelas sofrem continuamente e os efeitos disto nelas, que ele nomeia de depressão. É claro que se viver uma situação desta uma única vez, já traz efeitos bastante fortes no estado emocional de uma pessoa, imaginem o que é viver isto com frequência? Necessariamente quem sofre deste terror, deste mal como causa de sí mesmo,pode perder a esperança, pois vivemos numa época onde há uma banalização da violência, tanto pelas autoridades, que só a assistem pela tv e pelos números, como uma convivência pacífica e indiferente da maior parte das pessoas com a imoralidade dos que governam nosso país, nosso estado, nossas cidades, sem serem cobrados, e esta falta de esperança irá em determinadas pessoas, ter efeitos depressivos, que muito propriamente Reginaldo fala em seu email: "é claro q cada um em sua estrutura".
E é para falar da depressão que precisamos esclarecer alguns pontos: primeiramente o uso desta palavra depressão estendeu-se para muitas coisas, que propriamente não têm necessariamente nada de depressão nelas. Não sei se vcs sabem que houve uma mudança no Código Internacional de Doenças, já faz alguns anos, onde a psicose maníaco/depressiva desapareceu do Código e surgiu uma nova classificação chamada "transtorno bipolar de humor". Penso que houveram duas razões para isto: a primeira foi o desconhecimento da psicanálise por parte de alguns psiquiatras, portanto o desconhecimento do conceito de "Estrutura", que vale lembrar, existem três: as neuroses (histérica e obsessiva), as psicoses( paranóia, esquizofrenia, psicose maníaco/depressiva, melancolia e alguns afirmam, não eu, que estados limítrofes aí se encontram) e por último as perversões( sadismo, masoquismo, pedofilia, fetichismo, etc, são muitas para citar todas). Depressão propriamente só deve ser medicada com certeza na psicose maníaco/depressiva, ou quando os que têm estrutura neurótica, por razões diversas, os traços depressivos comuns em sintomas encontrados em nossas estruturas, aumentam extremamente de intensidade, sempre por algum fator interno, pois mesmo quando há algum acontecimento que provoca a intensificação deste traço, dependerá da particularidade sintomática de cada sujeito.
Outra razão para a mudança no Código, penso que ao retirar a depressão da psicose e colocá-la numa nomenclatura mais 'leve', deveu-se ao forte markting dos laboratórios que são poderosíssimos e como devem saber, as medicações para depressão, as chamadas 'pílulas da felicidade', são um dos medicamentos mais vendidos no Brasil, porque será, aumentaram os casos de psicose ou intensificação de traços depressivos ou as pessoas não querem mais pensar?
Coisa perigosa é esta de parar de pensar, pois como relaciona Hannah Arendt em seus estudos sobre o totalitarismo, o mal está relacionado ao vazio reflexivo, apontando assim uma possível direção para se compreender a violência nas sociedades contemporâneas.

É exatamente isto que desejo assinalar: depressão propriamente depende da estrutura, ou seja, mais precisamente na estrutura subjetiva nomeada por Freud de "psicose maníaco-depressiva". Nas estruturas "normais" que em psicanálise chamamos de neurose, histérica ou obsessiva, encontramos traços depressivos, mais ou menos pregnantes.
Deste modo, vamos nos atentar um pouco mais a essas questões? Mesmo porque, por mais fantástico que foi o investimento histórico em tecnologias que melhoraram a vida de muitos, não houve em contrapartida nenhum investimento para melhorar a saúde mental das pessoas. Não esqueçamos que o "parar de pensar" diz respeito aquilo que precisamos esquecer e que recalcamos e a alienação, é condição de nos estrurarmos e daí não podemos ver nem saber de muitas coisas, por não suportarmos, isso são sintomas que carregamos sem nos dar conta e que podem ser trabalhados até perdermos o medo e desaparecem quando fazemos uma psicanálise.

Sunday, October 05, 2008

"SÍNDROME DO PÂNICO".


Quem leu o exelente livro de José Saramago "Ensaio sobre a Cegueira" ou assistiu o filme de Fernando Meirelles sobre o livro, otimamente retratado, me acompanhe. Os personagens ao ficarem cegos, não o ficaram pela via da escuridão, mas sim do branco, que é a junção de todas as cores e que no filme apaga todas as imagens, não somente do campo visual, mas como veremos, as certezas subjetivas também, onde após esta experiência, o sujeito terá necessariamente que se perguntar quem ele é.

Pensei que esta metáfora pode me servir para falar da chamada síndrome do pânico, pois a invasão da angústia Real no momento de crise, cega o sujeito para suas sensações mais lógicas de seu corpo e este sente medo de morrer ou perder-se de sí mesmo, ficando parado na frente de um abismo onde o sujeito pode literalmente cair, deixar-se levar enquanto tal. Neste momento podemos dizer que há algo que faz furo no campo do saber do sujeito e aí gostaría de usar esta metáfora, por ser este tipo de crise alguma coisa que é efeito da sintomática na Neurose Obsessiva, e é incomum ser encontrada na Neurose Histérica. O saber no obsessivo serve-lhe como defesa e assim é que enxergo esta metáfora, este saber como a cegueira branca que oblitera qualquer possibilidade de visão para além deste saber constituído e não permite que este saber tenha furos, por isso a declanchagem das crises de pânico. Estas crises podem servir ao sujeito para que este procure alguma forma de ajuda e infelizmente a mais comum é que este busque uma forma somente medicamentosa para lidar com este problema que de fato é de outra ordem, qual seja, um problema de estrutura subjetiva. Não quero dizer aqui que a medicação as vezes não se faça necessária em alguns casos, embora até hoje todos os casos que eu tenha tido sob meus cuidados, não tenha sido necessário e as crises não demoraram muito para desaparecer. Experimentem dar a pessoa no momento da crise uma dose de alguma bebida destilada( naturalmente se esta pessoa puder ingerir alcool, pois isto fará com que ela relaxe a grande tensão que isto provoca e leve-a até um espelho e faça-a ver sua própria imagem. Daí ela começará a falar e a crise desaparece rapidamente. Estou sugerindo isto como um paleativo no momento da crise, mas evidententemente não há como tratá-la sem chegar a causa. E a causa destas crises está neste saber absolutizado e no medo que este tem de perder alguma coisa deste saber, pois faz a fantasia de que esta perda gerará o caos, que ele irá se encontrar com seus desejos mais primitivos e estes desejos estão adscritos na maior parte das vezes, ao sexo como sujo e a todos os desejos escatológicos.